Déficit de armazenagem: Um gargalo para o crescimento da produção de grãos no Brasil
- Agrológica Projetos e Consultoria

- há 6 dias
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Por: Stefano Sebastian Cardoso dos Santos
Déficit estrutural compromete competitividade do agronegócio brasileiro, enquanto produção cresce seis vezes mais rápido que a capacidade de estocagem.

A produção de grãos no Brasil deve atingir um novo recorde na safra 2024/25, com projeções da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) indicando 322,47 milhões de toneladas, superando em 0,8% a supersafra de 2022/23. Apesar do otimismo econômico, o déficit na capacidade de armazenagem ameaça a qualidade e o aproveitamento dessa produção.
Em 2025, a capacidade estática nacional alcançou cerca de 213 milhões de toneladas, com crescimento muito tímido (+0,5% ao ano) frente ao crescimento da produção de grãos.
Esses dados revelam que o país armazena apenas cerca de 65% a 70% da produção de grãos, ou seja, há um déficit estimado de 100 milhões a 120 milhões de toneladas de capacidade.
O déficit de armazenagem no Brasil tem se intensificado ano após ano. O país segue batendo recordes de safra, impulsionado principalmente pelo aumento da produtividade, porém os investimentos em infraestrutura de armazenagem não têm acompanhado esse crescimento. Entre 2010 e 2025, a produção de grãos cresceu em média 5,27% ao ano, enquanto a capacidade estática de armazenagem avançou apenas 2,80% ao ano. Esse descompasso resultou em um desequilíbrio expressivo entre o volume produzido e o espaço disponível para estocagem, consolidando um déficit estrutural de armazenagem em nível nacional.
Esse cenário tende a se agravar diante das projeções do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) para os próximos dez anos. A estimativa é que a produção de grãos brasileira alcance 379 milhões de toneladas na safra 2033/2034, representando um aumento de 27% em relação à safra 2023/2024. Caso esse crescimento não seja acompanhado por investimentos proporcionais em infraestrutura de armazenagem, o país poderá enfrentar perda de competitividade no mercado internacional.
A falta de infraestrutura adequada compromete a conservação dos grãos. Após a colheita, grãos como a soja continuam vivos e, por respirarem, aquecem. Em determinados gradientes de temperatura, há a proliferação acentuada de fungos e o aumento da ação de insetos. Hoje, sabe-se que grãos submetidos a temperaturas abaixo de 17°C têm maior resistência quanto à deterioração provocada por esses tipos de agentes contaminantes, por isso, é crucial ter um armazém onde pode-se controlar a temperatura.
O armazenamento dos grãos se faz necessário, justamente como uma tentativa de preservar os grãos obtidos durante a safra, conservando suas propriedades, podendo ter o comércio e uso dos grãos mesmo fora dos períodos de colheita (Oliveira et al., 2022).
A falta de armazéns suficientes para atender à demanda impacta toda a cadeia produtiva, dentro e fora da porteira. A insuficiência de estruturas de armazenagem para o recebimento e processamento da produção pode gerar atrasos na colheita, perdas no campo, venda em períodos desfavoráveis, aumento do custo do frete, congestionamento nos portos e processamento inadequado devido ao excesso de grãos concentrados no período de safra.
Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), é ideal que a capacidade estática de armazenagem seja 20% superior ao volume produzido em uma região ou país, garantindo segurança em casos de superprodução. Aplicando esse parâmetro, o Brasil deveria dispor de 387 milhões de toneladas de capacidade estática para atender ao padrão recomendado, o que evidencia um déficit de 176,9 milhões de toneladas.
Uma alternativa para reduzir esse déficit é ampliar a participação da armazenagem on-farm, feita dentro das propriedades rurais. Em 2024, essa modalidade representou apenas 16,83% da capacidade total do país, percentual muito inferior ao de outras nações agrícolas: 65% nos Estados Unidos, 50% na Europa e 40% na Argentina.
O alto custo inicial de investimento em infraestrutura e a falta de linhas de crédito acessíveis são os principais entraves à expansão da armazenagem on-farm no Brasil. Por isso, é essencial estimular políticas públicas e programas de crédito subsidiado, menos burocráticos e com maior alcance, para impulsionar a construção de armazéns nas propriedades rurais e, assim, reduzir o déficit de armazenagem e fortalecer a competitividade do agronegócio nacional.
O país conta atualmente com 11.921 unidades armazenadoras ativas, distribuídas de forma desigual pelo território nacional:
Mato Grosso: Lidera em capacidade com 52 milhões de toneladas, mas ainda enfrenta déficit de 51% em relação à sua produção;
Rio Grande do Sul: Possui o maior número de instalações (3.278), refletindo um modelo de armazenagem mais pulverizado;
Rondônia: Apresenta o déficit mais crítico, chegando a 75% de sua produção;
MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia): Região de fronteira agrícola com déficit de até 60%.
Comparativo Brasil X Estados Unidos
A diferença de competitividade entre o Brasil e os Estados Unidos torna-se clara ao analisar a infraestrutura de armazenagem dos dois países:
Capacidade total: os EUA contam com 615 milhões de toneladas, quase três vezes mais que a capacidade brasileira;
Armazenagem nas propriedades: cerca de 65% da capacidade americana está localizada dentro das fazendas, enquanto no Brasil esse índice é de apenas 17%;
Autonomia comercial: os produtores norte-americanos têm maior flexibilidade para estocar seus grãos e vender em períodos mais vantajosos, evitando a pressão por comercializar logo após a colheita.
Além disso, o custo de construção de silos no Brasil tem aumentado expressivamente, passando de R$ 700 por tonelada em 2019 para cerca de R$ 1.100 em 2025, o que dificulta novos investimentos e amplia o desafio de expansão da capacidade de armazenagem nacional.
Referências
LUIZA FATORELLI. Supersafra de Grãos Pode Levar Brasil a Recorde de Déficit de Armazenagem em 2025. Disponível em: <https://forbes.com.br/forbesagro/2025/02/forbes-mulher-agro-supersafra-de-graos-pode-levar-brasil-a-recorde-de-deficit-de-armazenagem-em-2025/>.
JULIANA. Brasil precisa de R$ 102 bilhões para superar crise de armazenagem de grãos - Agrishow. Disponível em: <https://digital.agrishow.com.br/culturas/graos/brasil-precisa-de-r-102-bilhoes-para-superar-crise-de-armazenagem-de-graos/>. Acesso em: 30 out. 2025.
GUILHERME DORIGATTI. Déficit de armazenagem no Brasil chega a 120 mi de toneladas e setor alerta para caos logístico e perdas bilionárias. Disponível em: <https://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/logistica/402314-deficit-de-armazenagem-no-brasil-chega-a-120-mi-de-toneladas-e-setor-alerta-para-caos-logistico-e-perdas-bilionarias.html>. Acesso em: 30 out. 2025.
LENNON, S. Safra de grãos expõe déficit de armazenagem no Brasil. Disponível em: <https://www.agrolink.com.br/noticias/safra-de-graos-expoe-deficit-de-armazenagem-no-brasil_498404.html>. Acesso em: 30 out. 2025.
Mapa. Produção de grãos brasileira deverá chegar a 390 milhões de toneladas nos próximos dez anos. Ministério da Agricultura e Pecuária, 2023. Disponivel em:
<https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/producao-de-graos-brasileira-devera-chegar-a-390-milhoes-de-toneladas-nos-proximos-dez-anos>. Acesso: 06/10/2025.








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